1.Hesitei até à ultima da hora. Tinha previsto ir à concentração de Sanxenxo, organizada pela moto clube local, sendo um óptimo pretexto para conhecer aquela região da costa Galega, que vai desde A Guarda, passando por Baiona, Vigo e toda a região das Rías Baixas, Cangas, O Grove, as ilhas de La Toja e de Arousa, Cambados, Vilagarcía, Noia, Muros, terminando no Cabo Fisterra (Cabo Finisterra). Ao longo da última semana tinha acalentado a expectativa, todavia, na contingência desagradável de ter de viajar ‘a solo’ para um local algo longínquo e abrangendo uns dois ou três dias, fez-me hesitar até à manhã de sábado, dia 9 de Setembro. Levantei-me sonolento e bastante cedo, para à última desistir. Paciência, fica para uma próxima. Pelo menos evito a exportação de divisas .
2. Pela manhã resolvi rumar até Coimbra sendo que, acaso num repente mudasse de ideias, era só entrar na A1 e seguir viagem, pois segundo o Viamichelin, a viagem não duraria mais que umas 3 horas. Todavia, acabei por me demorar e, tendo almoçado num restaurante perto de Eiras, resolvi iniciar um passeio mototuristico local, totalmente de improviso, sem planos ou quaisquer preparações.Procurei por uma estrada secundária que me conduzisse para os lados de Penacova e de modo a não ter que voltar ao repisado IC1. E na verdade, não é que descobri uma ?!
2.1.)Moinhos de Gavinhos
E foi assim que numa viagem calma, sem pressas, fui seguindo ao ritmo suave do propulsor da CBF1000, descobrindo diversos lugares, como Logo de Deus, Brasfesmes, Agrêlo, rodando por uma estrada repleta de curvas tão agradáveis de dar, rodeado pela floresta imensa e fresca, até que fui surpreendido com um lugar, Gavinhos seu nome, com um belíssimo conjunto de moinhos de vento que lá no alto á esquerda, coroam o monte, chamados de MOINHOS DE GAVINHOS. Encontram-se em obras de recuperação. Um ganha-pão no passado das gentes, hoje um belo cartaz turístico para a região, pertencendo ao concelho de Penacova, distando a 5Kms da sede do concelho. Vitorino Nemésio, aqui bem perto, na Portela de Oliveira, também tinha e tem o seu moinho. Como nota de curiosidade, fiquem a saber que o concelho de Penacova alberga com o maior património molinológico do país, pois que é o que possui a maior concentração de moinhos em Portugal e o maior número está em Gavinhos. Segui pela estrada estreita e asfáltica até chegar perto dos moinhos, onde sou surpreendido, por um lado, com uma Santa Imaculada gigante, postada no meio dos moinhos e a abençoar as aldeias que ficam no vale, por outro, pela belíssima paisagem envolvente, de onde se avistam outeiros alcantilados, vales profundos, breves planaltos ou rudes penedias. Para norte a Serra do Buçaco.
2.2) Mosteiro de Lorvão
Voltei á estrada principal, a EM535 e segui até voltar para a EM535-1 que segue para um vale estreito que acolhe o Mosteiro de Lorvão, aquele que nos traz à lembrança as encantadoras e mais antigas iluminuras do nosso património artístico. O Mosteiro do Lorvão, funciona actualmente como hospital psiquiátrico. Apenas fiz uma breve paragem, sem bem que o interesse histórico é de tal modo notável que bem justificava uma visita prolongada. Com efeito, a fundação deste mosteiro remonta ao século VI. A partir da reconquista cristã de Coimbra em 878, o Mosteiro de Lorvão desempenhou um importante papel no fomento agrário e repovoamento da região. Os seus abades converteram-se em importante figuras da época e atingiu-se um alto nível cultural, testemunhado pelos livros copiados e iluminados como o livro das Aves (1183) e o Comentário ao Apocalipse (1189). No Lorvão existiu a primeira comunidade feminina da ordem de Cister em Portugal. Quase tudo o que resta hoje em Lorvão, é fruto das reformas dos edifícios operadas nos séculos XVII e XVIII, com destaque especial para a Igreja construída entre 1748 e 1761.
3. Penacova.
"É preciso chegar às aberturas e miradouros para achar a razão de ser da fama de Penacova que é o seu admirável panorama de água, pinho e penedia" (Vitorino Nemésio)
Prossegui viagem pela EM 535, de curva em curva, rumo a Penacova, desembocando na N 110, que vem de Coimbra e bordeja o Rio Mondego. Subo àquela imponente vila, erguida lá no alto. No centro estaciono no jardim, bem sombreado e fresco e sigo para um promontório a que chamam a Pérgola Raúl Lino. Lá em baixo e em frente, avista-se o Rio Mondego, de água límpida, correndo devagar e mansamente, em curvas entre montes escarpados e uma praia fluvial, tudo numa grande tranquilidade que se respira. Muitos locais haveria a visitar, mas restringi a visita a uma rápida investida por algumas ruas da vila, à Igreja Matriz dedicada a Nossa Senhora da Assunção ( segunda metade do século XVI) e a uma outra já à saída, que tem gravada em pedra a era de 1581.
4. Buçaco ou Bussaco
4.1.De Penacova segui rumo à Serra do Buçaco, passando pelo Casal de Santo Amaro, com os seus fornos de cal parda, agora reconstruídos, apenas vistos de relance, seguindo por um caminho florestal pelo Carvalho até me embrenhar bem na pureza da serra, local mágico e como que isolado do resto do mundo. Foi então que percorrendo esta serra pelo seu lado nascente, fui desfrutando das sombras e do ar fresco e puro que emana da enorme e bem conservada mancha florestal de pinheiros, cedros e outras espécies que ali povoam, que realmente me comecei a sentir plenamente bem, depois da vaga de calor da última semana que se fez sentir por todo país, onde dentro de casa era pouco melhor que estar dentro dum forno ! Passei pela estrada que dá acesso ao Museu do Moinho de Vitorino Nemésio, mas não visitei ( sei contudo ser o espólio constituído por objectos de molinologia ). Entrando pela entrada da mata rumei em direcção á Cruz Alta. O panorama daqui é arrebatador. Podemos abarcar toda a paisagem entre a serra da Boa Viagem na Figueira da Foz até á ria de Aveiro. Ao fundo a luz do sol espelha-se nas águas do mar.
4.2 Prossegui com a visita ao obelisco ( monumento comemorativo da batalha do Buçaco e os feitos militares durante as guerras peninsulares) situado fora dos muros da mata e ao Museu Militar, que alberga um valioso espólio de armamento ( canhões, sabres, pistolas etc,), uniformes militares, gravuras e diversas relíquias. De realçar a existência de alguns manequins vestidos com os uniformes militares da época que dão impressão de serem homens vivos. Ao lado do museu fica a capela do Encarnadouro que serviu de hospital de sangue ao exército anglo-luso durante a batalha.O Museu deve ser um ponto obrigatório de visita para que rume por estas paragens. A entrada custa a módica quantia de 1€.Relembremos que a batalha do Buçaco foi travada há 197 anos, no dia 27 de Setembro de 1810.
4.3. Prossigo na visita, agora na direcção do ex libris, o Palácio do Buçaco e da sumptuosa mata envolvente , pagando à entrada com 1€ ( para motas ).Sabe-se que em 1094 o local era já posse do bispo de Coimbra, que em 1628 a vendeu à ordem dos Carmelitas Descalços. O convento, ermidas, muros e caminhos foram por eles construídos, tendo também plantado e tratado as árvores da mata. Em 1834 a mata passou a propriedade do Estado, tendo sido então introduzidas muitas espécies novas. No século XIX foi construído o notável "Palace", palacete neo-manuelino, com claras inspirações no Claustro dos Jerónimos, na Torre de Belém e no Mosteiro de Santa Cruz em Coimbra, de grande feito e impacto paisagístico, arquitectónico, escultórico e grandiosa representatividade cultural e artística, destinado a pavilhão de caça real, mas mais tarde transformado num Hotel ( Hotel Palace ).Como nota de curiosidade, temos a oliveira onde o Duque de Wellington ( comandante das tropas anglo-lusas )amarrou o seu cavalo, perto do convento revestido a cortiça onde pernoitou. A mata é um local paradisíaco, onde abundam árvores idosas e de porte gigantesco, um bosque espesso de cedros, abetos, sequóias, tílias, ulmeiros, faias, redoendros, fetos gigantes, acácias e freixos, provenientes da América, da Austrália, dos Himalais ou de tantos outros locais do mundo, plantadas e cuidadas por gerações de monges que viveram em clausura e contemplação por mais de 200 anos. Depois da contemplação do Palácio e dos belíssimos e românticos jardins envolventes, aproveitei para fazer um passeio pedestre pelo interior da floresta, onde também se podem ver fontes, ermidas, os passos da Via Sacra, Portas, cruzeiros etc, tudo numa atmosfera de absoluta tranquilidade, pois este local é único em toda a Europa e não é por acaso que os estrangeiros ali aterram ás pabeias. Era tarde e tive que acelerar a visita, pois o sol ameaçava pôr-se no horizonte. Prazeres sublimes, num resto de tarde de Domingo aqui vivido.
5. Luso
Após, segui na direcção da vila do Luso, tão conhecida pela pureza das suas águas termais e situada na encosta poente da Serra do Buçaco, rodando pela estrada que vem de Mortágua. Uma breve paragem na avenida principal, de jardins e lojas de recordações. Ao lado a fonte de S. João, ou das Onze Bicas, onde há uma capela dedicada a S. João Evangelista cuja edificação remonta ao século XVIII. Breve passeio pelas aprazíveis ruas, onde ponde pude admirar a arquitectura de algumas das suas casas, solares e hotéis, a fazer lembrar Sintra. Aproveitei a encher a garrafa que trazia na top case com água fresca nas bicas da Fonte de S. João. As pessoas amontoam-se ali em bicha para levar uns quantos garrafões, certamente convencidos que se trata da verdadeira água do Luso. É quase noite, rumei na direcção da Mealhada, para voltar a Coimbra pelo IC1.Enfim, mais um belo e imprevisto passeio moto turístico, na companhia da minha Honda CBF1000 que, pela sua cor verde, cedo se integrou harmoniosamente com as cores dominantes da Serra do Buçaco.
Agora atenção, esta volta foi "ao contrário", pois habitualmente começa-se no Luso, Bussaco e só depois Penacova.
E não esquecer umbom almoço num daqueles restaurantes da Mealhada, apenas distante 5-6 Kms, onde se degusta o reginalíssimo leitão assado !
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