quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Passeio pelo nordeste Alentejano até à mui nobre e fidalga Vila Viçosa

















6/10/2007

1º§ - Há muito que esperava pelo dia em que pudesse visitar Vila Viçosa. Foi no ano passado, que, em serviço por Cascais juntando o útil ao agradável visitei o Palácio da Pena, na Serra de Sintra e logo fiquei maravilhado pelo local, pitoresco e aprazível, com a sua floresta ao redor, encantada e fascinante e, por inerência, pela vida da última família da nossa monarquia ( portanto do período imediatamente anterior á implantação da República ). Foi neste local que me apercebi que na fatídica noite que precedeu o assassinato do Rei D. Carlos e do seu filho primogénito e sucessor, a família real estivera no Paço Ducal de Vila Viçosa. Daqui o contágio e a vontade de visitar e conhecer Vila Viçosa…

2º§ - Tinha feito uns quantos telefonemas para ouvir justificações duns amigos para dizerem não poder ir. Porém, cheguei ao dia “D” no passado sábado dia 6/10/2007, por sinal dia do meu aniversário e dia dos Castelos. Pelas 5.00H da matina ainda fazia noite, saltei da cama porque a insónia era dum tamanho maior que o meu inútil despertador… A vila encontrava-se profundamente adormecida. Certamente ninguém deu conta de mim, quase até que podia ouvir o ronco do ressonar…
O objectivo era rumar ao nordeste do Alentejo e visitar a «mui nobre e fidalga» Vila Viçosa.
E assim parti para surpresa numa madrugada repleta de nevoeiro, de escassa visibilidade e algo friorenta. Ainda em casa e com o calor enganador intramuros, só me apetecia levar as roupas normais. Porém, no decurso da viagem, com um frio acentuado e a brisa do nevoeiro á mistura, dei graças a Deus por trazer o fato de inverno, com o blusão montado do forro em “H2Out” e as calças “Dainese” de “ Goretex”.
Segui pelo IC3, passando por Condeixa-a-Nova, Penela e por uns quanto lugarejos até chegar a Tomar. Com o avanço da viagem, tendo como única companhia o ronco do propulsor da CBF1000, quilómetros e após quilómetros, eis que nevoeiro não dava sinais de abrandar, quando o meu prognóstico era de que mais alguns quilómetros depois e logo desapareceria. Praticamente só conseguia avançar vendo uma nesga de estrada, uns escassos metros na minha frente, o perigo era uma constante a cada curva. A visibilidade estava ameaçada, a brisa do nevoeiro batia na viseira do capacete e encharcava-a, de vez em quando amainava quando passava a luva, para logo depois voltar a encharcar e voltar a não ver nada e assim sucessivamente. O remédio foi levantar a viseira e levar com a brisa na fronha. Comecei a resfriar da face, o esforço era tremendo, estava tudo muito complicado de tal ordem que ainda coloquei a hipótese em desistir e voltar ao conforto do ninho …
Porém não desisti e resolvi prosseguir. A pouco e pouco, fui vendo o romper da aurora, o dia chegar às aldeias sonolentas, aos campos e montes e a pouco e pouco a vida parece voltar. Parei para abastecer num posto de gasolina, pouco passava das 7.00H. Com os joelhos regelados, pergunto ao gasolineiro, homem de poucas falas, se têm casa de banho, para depois vestir o forro das calças de goretex. Aquele mostra-se estranho e distante, de pouca confiança, ao ver um tipo assim vestido de negro.
Prossigo na viagem, agora sim, sinto um conforto excepcional, com o fato completo acolchoado pelos forros. Prossigo na viagem, enfrentando o maldito nevoeiro, que já perto de Tomar persiste em não dar sinais de abrandamento. Pretendia sair na direcção da barragem do Castelo do Bode e depois seguir para Abrantes, mas por causa do nevoeiro engano-me na rota, indo parar a uma povoação chamada Serra. Perguntei a uns tipos que logo bem cedo se prontificavam à porta da taberna, na certa para matarem o bicho com uma aguardente, se estaria no caminho certo para a barragem. Não, não estava, estava perdido, o melhor era voltar para trás, chegar a um lugar onde avistaria uma placa a dizer “ Cabeça do Homem” depois seguir “abaixo por S. Pedro” e lá chegaria. Assim fiz, bateu certo.
Chego á barragem de Castelo do Bode, páro para umas fotos. O nevoeiro é tão intenso que quase não deixa ver nada. Sigo a rota, querendo rumar até Abrantes, mas fui inesperadamente parar dentro de Constância. Como é possível ? Vai de rogar umas quantas pragas. Maldito nevoeiro, acho que nesta natureza perfeita tinha que sair uma aberração, pois não lhe lobrigo utilidade alguma. Voltas e mais voltas, sempre coberto do nevoeiro, as horas apertam e ainda não estou no Alentejo. Deparo-me com o acesso à A23, paro á entrada para dar uma olhada pelo mapa e resolvo seguir. Este troço Constância-Abrantes faz-se relativamente rápido e não se paga portagem. Atravesso Abrantes, de novo na companhia do nevoeiro, atravesso a cidade e só paro para perguntar se vou no caminho certo para o Alentejo ( “ sim, sim, sempre em frente, atravessa a ponte sobre o Tejo”). Assim fiz, atravesso o rio e passo por Rossio ao Sul do Tejo, prossigo pela EN2 até Ponte de Sor. A pouco e pouco, já em pleno Alentejo, o nevoeiro foi limpando e desaparece completamente, deixando avistar-se a melancólica vastidão da paisagem alentejana, dos montados de sobro e azinheiras. Em Ponte de Soe detenho-me para tomar o pequeno-almoço. Prossigo na viagem na direcção de Alter do Chão pela N119 e N369, com estradas quase rectas, de bom piso e acompanhado dos chaparros. Em Alter do Chão, à entrada divisa-se um monumento ao cavalo e um pouco antes, umas placas que indicam estarmos na Rota dos Vinhos do Alentejo. Fiz uma breve incursão à vila, parando junto ao Castelo, umas fotos e seguir em direcção a Fronteira pela N245, onde nem ao menos paro. Bem se avista um largo com umas quantas igrejas, um largo passeio de pedra calçada com uns bancos onde vários homens ali descansam logo pela manhã, olhando quando ouvem o aproximar duma mota pelo ronco do motor que ali lhes aparece quebrando a monotonia… Conheço os lugares atrás citados quando em tempo fui caçador e então me perdia em jornadas de caça pelo Alentejo, que hoje abandonei completamente, a ponto de a considerar uma actividade anacrónica e inútil, mas, pelos vistos, há quem a considere a tábua de salvação destas imensas planícies pelas receitas turísticas que pode gerar... Sigo para Sousel, sempre rodando pelas rectas destas planícies sem fim, petrificadas de sobreiros. Avistam-se então as vinhas bem cuidadas e uma herdade com um palacete muito digno. Junto à placa da localidade na entrada paro para registar o momento, mas a minha presença é logo detectada por um cão corpulento e de ladrar rouco, que não sossega, até a dona abrir a porta e espreitar para ver quem é. Ao ver-me a fotografar parece mais confiante e retorna à sua casita. Sigo até ao centro, passeio a pé junto a umas igrejas, depósito de água, o jardim e pelas ruelas típicas. Não me demoro porque não há tempo a perder. E lá vou eu, a cavalo da CBF 1000, com o seu fiável e binarento propulsor rumo a Estremoz. Já perto a paisagem muda os seus tons para os vinhedos bem conservados e trabalhados. Apetecia visitar as adegas daquelas herdades, mas o tempo urge. Ao longe avisto Estremoz.

3º§ - Conhecia Estremoz praticamente só de passagem, não estando nos meus planos, mas resolvi parar e fazer uma visita pela zona histórica. A torre de menagem e a muralha do seu castelo recortam o horizonte, dando um vero ar medieval. «Estremoz é uma rainha encerrada no seu nostálgico castelo. Tem uma terra sigilata e eternos veios de mármore ocultos nas entranhas. Agrária, artesã e doceira ».
Estacionei a mota junto do jardim na zona central. Eram horas de almoço, mas não corri ao primeiro restaurante, pois não há tempo para comer, há que aguentar. Contente fiz um passeio pedestre pela zona , não sem primeiro me desembaraçar dos forros das roupas que, agora sob o calor do Outono alentejano, me traziam a transpirar e “lavado em água!”. Visito as igrejas ali erguidas ao redor, cujos nomes, detalhes históricos e artísticos não vou expor, dando uma visita de relance ao mercado do Rossio, que ali se realiza aos sábados em plena rua. O calor aperta. Por surpresa encontro-me com uma velha colega de curso, para um breve cumprimento e dois dedos de conversa. Não sei o que ficou a pensar ao ver-me assim vestido, cabelo esgadelhado e com cheiro a suor que tresandava. Confesso-me que me senti atrapalhado …
Posto isto, após umas quantas fotos, foi tempo de rumar ate ao Castelo. Entrei por uma daquelas portas medievais rasgadas nas muralhas, do lado poente. Estacionei frente à torre de menagem onde, mesmo ao lado funciona uma estalagem ( penso que era uma antiga residência real). Aqui sente-se o regresso ao passado, um passado de esplendor, envolto nas lembranças das lutas de armas contra os mouros, dos amores adúlteros, das chacinas sangrentas e dos intermináveis festins que nunca mais se repetirão. Ali, onde a alma da cidade ficou presa como as princesas dos contos de fadas, onde a história tende a tornar-se imprecisa, a enredar-se nas malhas da lenda. Ali, na parte velha e petrificada que o ouro do tempo foi cobrindo. Ofegante a trepar ladeiras, escadinhas, ruas íngremes e lajeadas, fui percorrendo a zona histórica. O que me vai salvando é uma garrafa de água mineral que trago na top case, onde de vez em quando acorro para dessedentar-me. Presente uma estátua de Isabel de Aragão que no seu pedestal vai recebendo as famílias de turistas que procuram levar o retrato, sem vestígios de rosas nem de pães ... Imponente a sua torre de menagem. Mas eu não vim de propósito para visitar Estremoz e, se me demorar, falho o alvo principal. Há, pois, que prosseguir viagem.

§4º - Percorridos escassos 13Kms, pela EN4, fica Borba. Honra que seja feita, mas o melhor atractivo que tem é desde logo a Adega Cooperativa que fica à entrada, do lado direito. De resto, umas quantas ruas de traça antiga, onde abundam as lojas de antiguidades, várias igrejas seculares, um palácio, a muralha do antigo castelo e não lhe consigo alcançar outros pontos de grande interesse. A visita é rápida, sinto os primeiros sinais de “fome” , podia entrar num tasco qualquer, mas não, sigo rapidamente para Vila Viçosa, o meu objectivo, porque a tarde começa a avançar. À saída e no caminho para esta vila, avistamos as inúmeras pedreiras de extracção de mármore, com vários montes dessas pedras e gruas que não deixam dúvidas a ninguém, ou seja, estamos no coração das jazidas do mármore.
Até Vila Viçosa é rápido, são escassos 6 Kms. Também logo à entrada sigo para o miradouro, onde tiro umas fotos e me deparo com a entrada para a Tapada. O local tem uns eucaliptos de grande porte, sendo convidativo para um breve descanso. Até aqui resisti à vontade de comer ( sim, isto não é fome ) e então saco dumas sandes e cervejas que trazia à cautela na top case e improviso ali um pic-nic, bem à pressa, porque a tarde avança. O local é ermo e dois carros que ali estavam, acabam por arrancar, possivelmente assustados pela minha presença.

§5º - Desço pela estrada do miradouro e entro na estrada que dá acesso ao centro de Vila Viçosa, para logo, bem à entrada, localizado do lado direito, avistar o imponente PALÁCIO DUCAL DE VILA VIÇOSA, a morada ancestral dos Bragança, o meu objectivo principal. Foi a antiga residência dos Duques de Bragança desde os princípios do século XVI, a sua construção iniciou-se em 1501 - 1502 (na ala Norte) e completou-se já no século XVIII. A fachada principal é toda revestida de mármores da região e inspira-se na arquitectura italiana renascentista, com três andares. Aquele enorme espaço amplo á sua frente é o Terreiro do Paço, uma das mais belas praças do país, à direita a Capela Real e os Jardins do Paço.
[Aqui viveu aquele que, após a Restauração da Independência em 1 de Dezembro de 1640, na sequência do golpe dos conjurados contra o domínio espanhol de Portugal, pelos Filipes, foi o encabeçado para a causa e aclamado rei: D. João IV de Portugal, 8º duque de Bragança. Ao que reza a história, João aceitou a responsabilidade com relutância, incentivado sobretudo pela sua mulher Luísa de Gusmão.
Mais recentemente, aqui moraram, o Rei D. Carlos, a Rainha D. Amélia e os filhos D. Luis Filipe e D. Manuel. Como era habitual no início de cada ano, D. Carlos partiu com toda a família para Vila Viçosa e o seu palácio preferido. Aí reuniu pela última vez os seus amigos íntimos, promovendo as suas célebres caçadas. Entretanto, a situação política agravava-se em Lisboa, com a oposição ao franquismo, estalando uma revolta, abortada em 28 de Janeiro. João Franco decidiu ir mais longe e preparou um decreto prevendo o degredo sumário para as colónias asiáticas dos revoltosos republicanos. O rei assinou o decreto ainda em Vila Viçosa (consta que terá então dito: acabei de assinar a minha sentença de morte. A 1 de Fevereiro de 1908, a família real regressou a Lisboa depois de uma temporada no Palácio Ducal de Vila Viçosa. Viajaram de comboio até ao Barreiro, onde apanharam um vapor para o Terreiro do Paço. Esperavam-nos o governo e vários dignitários da corte. Após os cumprimentos, a família real subiu para uma carruagem aberta em direcção ao Palácio das Necessidades. A carruagem com a família real atravessou o Terreiro do Paço, onde foi atingida por disparos vindos da multidão que se juntara para saudar o rei. D.Carlos I morreu imediatamente, o herdeiro D.Luís Filipe ( de seu nome completo Luís Filipe Maria Carlos Amélio Fernando Victor Manuel António Lourenço Miguel Rafael Gabriel Gonzaga Xavier Francisco de Assis Bento de Bragança Saxe-Coburgo-Gotha ) foi ferido mortalmente e o infante D. Manuel num braço.
D. Manuel (de seu nome completo Manuel Maria Filipe Carlos Amélio Luís Miguel Rafael Gonzaga Xavier Francisco de Assis Eugénio de Bragança),veio a ser solenemente aclamado Rei aos 18 anos de idade, em 6 de Maio de 1908. Foi o último rei de Portugal, passando à história como o nome de D. Manuel II. Entretanto a situação política degradou-se progressivamente, tendo-se sucedido vários governos em cerca de dois anos. As eleições legislativas de 28 de Agosto de 1910 fizeram aumentar substancialmente os deputados republicanos no parlamento, o que motivou bastante a causa revolucionária. A 4 de Outubro de 1910, começou uma revolução e no dia seguinte, 5 de Outubro deu-se a Implantação da República em Portugal. O Palácio das Necessidades, sua residência oficial, foi bombardeado, pelo que o monarca foi aconselhado a dirigir-se para o Palácio Nacional de Mafra, onde se lhe viriam a juntar a mãe, a Rainha D. Amélia de Orleães e a avó, a Rainha-mãe D. Maria Pia de Sabóia. No dia seguinte, consumada a vitória republicana em Lisboa e a adesão do resto do país ao novo regime, D. Manuel II decidiu-se pelo exílio, embarcando na Ericeira no iate real Amélia. O rei ainda tencionou seguir para o Porto, mas os oficiais a bordo demoveram-no dessa intenção. Desembarcou em Gibraltar, de onde seguiu para o Reino Unido, onde foi recebido pelo rei Jorge V. O rei, apesar de deposto e exilado, teve sempre um elevado grau de patriotismo, o que o levou, em 1915, a declarar no seu testamento a intenção de legar os seus bens pessoais (os da Casa de Bragança), ao Estado Português, manifestando também a sua vontade de ser sepultado em Portugal. Faleceu inesperadamente na sua residência, em 2 de Julho de 1932. O Governo Português, chefiado por Salazar, autorizou a sua sepultura em Lisboa, organizando funerais de estado. Os seus restos mortais chegaram a Portugal, em 2 de Agosto, sendo sepultados no Panteão dos Braganças, no mosteiro de São Vicente de Fora em Lisboa].
Por sorte arranjei parque logo à entrada, pese embora o local estar muito concorrido com automóveis de turistas. Segui até à entrada e tiro o bilhete. Custa 5€ a visita interior ao Palácio, entrando grupos de 30 pessoas de cada vez, sendo necessário esperar.
A visita inicia-se e somos transportados para a escadaria principal que dá o hall principal. Logo ressalta a beleza interior do monumento. No interior das suas salas visitáveis guardam-se as peças das preciosas colecções de arte e as raríssimas espécies bibliográficas que pertenceram ao rei D. Manuel II. Destacam-se pinturas dos artistas portugueses do século passado ( Malhoa), ourivesaria, tapeçarias persas, flamengas, arraiolos, pinturas a fresco em paredes e tectos, mobiliário de estilo, porcelanas orientais, portuguesas, italianas e de outras origens, armaria antiga com peças raras de fabrico oriental, português, alemão, francês, etc. . Na sala principal das visitas, uma colecção de quadros dos duques de Bragança e dos que foram reis. Destaque para os quadros pintados pelo próprio rei D. Carlos ( rei artista), os seus aposentos e da Rainha D. Amélia, os berços dos príncipes, as camas, roupas, livros, pertences pessoais, como se ainda ali vivessem e se tivessem ausentado por instantes...
Saliente-se ainda o famoso quadro que representa o rei D. Carlos com o seu Estado Maior numa parada e que faz de capa dos livros de história, as porcelanas, a sala de jantar, a capela ( que diz o guia possuir uma excelente acústica e onde se realizam concertos ) e a cozinha com a grande colecção de apetrechos em cobre. Ainda a não esquecer são os jardins de arbustos verdes em minucioso recorte geométrico, de formas variadas. Por visitar ficou o museu dos coches.
Saí pela porta dos nós para a estrada que vem de Borba.
Este Palácio deve ser ponto obrigatório para qualquer turista e, muito especialmente, para qualquer moto turista que rume por estas paragens.

Prestei-me então a passear pela as ruas desta terra, histórica, linda e bela. Em geral os edifícios da zona histórica, conservam as suas fachadas de antanho, o que nos faz sentir como que de regresso ao passado. Qualquer fotógrafo ou pintor encontra aqui motivos de sobra. Rumo até ao imponente Castelo. A primitiva fortificação da Vila pertenceu ao rei D. Dinis, que lhe fundou o Castelo e a Cerca Velha, em obra levada a efeito na última década do século XIII. Este primeiro castelo, com a Torre de Menagem, desapareceu na segunda vintena do século XVI, quando os duques donatários D. Jaime e D. Teodósio I construíram a subsistente fortaleza artilheira, do tipo italiano mas seguindo o modelo das praças africanas e indostânicas que os portugueses haviam introduzido nas suas conquistas ultramarinas. No interior da muralha, uma fortaleza, rodeada por um fosso e possuindo uma ponte levadiça que dá acesso à porta principal. Azar, eram 18.00H e já havia encerrado, sendo que no seu interior se esconde um espólio urbano e artístico da grande valor, com destaque para um museu de arqueologia. Ficará para uma próxima…
Da colina deste castelo, no longínquo horizonte, avista-se Juromenha e mais ao longe, Olivença.


§ 6 º- Já passavam das 18.00H, o cansaço e o sono acumulados recomendavam um regresso antecipado… porém, resolvi resistir. O ideal era passar a noite ali, mas com a minha sócia a moer-me o juízo pelo telefone … “olha que o menino quer-te cantar os parabéns”, “ lá porque não tiveste disso, quero habituá-lo a festejar as datas de aniversário”, “ com quem andas ?”, blá, blá, etc. etc.
Pois bem, com Alandroal e Juromenha ali tão perto, não podia desperdiçar a oportunidade, rumando para sul até tais terras, fronteiriças e tão carregadas de história.
Percorridos cerca de 12 Kms, com o sol a pôr-se no horizonte nestas paragens alentejanas, chego ao Alandroal, para logo rumar até ao castelo, bem conservado e de extrema beleza, com uma igreja no seu interior. Foi edificado no reinado de D. Dinis, com 1298, como data de conclusão, segundo uma inscrição que se mantém na Torre de Menagem.
Percorro a muralha duma ponta à outra, ofegante sinto-me cansado e com sede. Vou a uma pequena taberna junto da entrada, para dessedentar-me, tive que beber uma superbock, porque não têm água.
Prossigo à pressa, porque a noite está praticamente a cair, sigo pela EN373 até Juromenha, uma aldeia fronteiriça junto ao rio Guadiana. Claro o ponto de interesse é o seu Castelo de Juromenha. Devido à sua posição estratégica, foi ocupada por povos anteriores ao domínio romano da península, e o próprio Júlio César, em 44 a. C., terá mandado reforçar as suas defesas.
A ocupação muçulmana durou quase dois séculos, mas em 1167, D. Afonso Henriques, tomou este castelo, que seria de novo conquistado pelo califa Almançor, para, em 1191, regressar definitivamente à posse portuguesa.
O rei D. Dinis, concedeu-lhe Carta de Foral em 1312, seguindo-se o reforço das suas defesas, de que fazia parte uma Torre de Menagem com cerca de 40 metros de altura. Durante a Guerra da Restauração foi construída uma nova fortificação. Também aqui, por volta de 1659, o paiol explodiu, destruindo muito das estruturas e causando bastantes mortes, também o terramoto de 1755, causou danos que levaram a novas obras de recuperação. Trata-se duma fortaleza que bem se vê estar muito arruinada e em péssimo estado de conservação. Porém, já passam das 19.00H e eu sou o seu único morador, com excepção dum casalito de jipe que entretanto também por ali apareceu. Daqui se avista o rio Guadiana, de águas barrentas e paradas, pois o enchimento da barragem de Alqueva chega ali e, do outro lado, uns campos cultivados e verdes, é Espanha. Olivença também se avista no horizonte. É praticamente noite e retomo a EN373 na direcção de Elvas, onde não paro, sigo ao outro lado da fronteira, atesto e regresso pelas 20.00H, agora numa viagem relâmpago pela A6 até Estremoz. Aqui torno a equipar-me com os forros, para depois prosseguir pela IP2 na direcção de Portalegre e depois Castelo Branco, onde faço um curto trajecto da A23, para finalmente sair pela IC8 ( zona de Vila Velha de Ródão/Proença-a-Nova ) até Ansião, algumas horas depois, para depois, numa noite fria e escura, atravessar a Serra do Sicó até Soure. De Badajoz até aqui fiz 300Kms, onde cheguei perto da meia noite.
E foi assim, mais uma excelente rota, pelo maravilhoso e histórico Alentejo, aos comandos da minha Honda CBF 1000.
Alcança quem não cansa !

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Por Penamacor, Sortelha, Sabugal e Alfaiates ( 28/09/2007)













POR PENAMACOR, SORTELHA, SABUGAL E ALFAIATES, DIA 28/09/2007

1.Há 700 anos, o rio Côa servia de fronteira natural entre os reinos ibéricos. Mas com o tratado de Alcanices, D. Dinis avançou a fronteira além Côa, cedendo como contrapartida a Castela algumas Praças Fortes a sul.
Só em teoria conhecia parte dessa região pelo que, apostado em conhecer o meu país, há meses que alimentava a ideia de fazer por lá uma passeata, sistematicamente adiada, no meu cavalo CBF1000.Na pretérita semana o tempo correu de feição, solarengo e de temperaturas amenas, pelo que o fim-de-semana se mostrava apropriado também. Eis senão quando verifico pelo http://www.meteo.pt/, uma previsão intolerável de chuva para sábado e domingo. Mais uma vez, era o desmoronar do projecto. Porém, chegado o sexta-feira de manha, dia 28 do mês de Setembro, deste ano da graça de 2007, perante um dia de sol radioso logo pela manhã, cogitei deixar o serviço e pôr-me a caminho, porque é triste na semana laboral fazer bom tempo e depois ao fim de semana vem o mau. De quem é a culpa não me perguntem. Assim fiz, quebrei a rotina, equipei-me, passei por casa dum amigo a quem entretanto telefonara para o levar de pendura ( quando se trata de passeio e fotografia aproveita e ás vezes vem), tendo partido na direcção de Pombal e, pelo IC8 até à A23, saindo depois na saída norte de Castelo Branco que liga á EN233, rumo a Penamacor, Sortelha, Sabugal e Alfaiates.


2. PENAMACOR – CAPITAL DO LINCE

A Vila de Penamacor é sede de concelho e de freguesia, pertence ao distrito de Castelo Branco. O concelho situa-se na Beira Baixa e é constituído por 12 freguesias. A norte faz limite com o concelho do Sabugal, a sul com a Idanha-a-Nova, a oeste com o Fundão e a leste faz fronteira com a Espanha.
As origens de Penamacor estão envoltas na bruma dos tempos, pouco se conhecendo de seguro a seu respeito. Afirma-se que esta vila foi pátria do rei Wamba, um rei dos Godos que governou a península desde 672 até 682. D. Sancho I, conquistou-a aos Mouros e reconstruiu-a. Deu-lhe foral em 1189 e entregou-a aos Templários na figura do seu mestre D. Gualdim Pais, que a fortificou. Funda o seu castelo ficando a ser peça importante na defesa desta região, pelos reinados de D. Dinis, D. Fernando e D. João I, que foram fazendo acrescentos ao castelo, para atingir na guerra da restauração uma importância relevante e estratégica sobre a fronteira.

Atingida por um raio em 1739, fez saltar a torre de menagem que hoje se chama de vigia por via de funcionar como paiol de pólvora.

Chegámos a Penamacor à volta das 14.00Horas e sem almoço porque não haveria sequer tempo para uma coisa facilmente prescindível, com algumas prévias e curtas paragens, para apreciar as paisagens e tirar umas fotos.
É surpreendente como a região denota logo não possuir aquela agitação própria dos lugares frequentados por multidões e ambientes sofisticados. Impera a calma, o silêncio, o longínquo horizonte, monumentos e casas graníticos e os odores da Natureza selvagem. Penamacor será aquela terra de quem busca paz e sossego, terra genuína e autêntica de gentes beirãs, parece ficar longe de tudo no meio de nenhures.
Começamos por subir à zona histórica onde existe um miradouro. Estaciono a mota numa rua de casas graníticas e tradicionais, para de seguida ir ao miradouro, onde se alcança uma vista impar ao seu redor, os telhados e ruelas da vila, as muralhas do castelo, a torre de menagem que hoje se chama de vigia, isolada sobre grandes rochas de granito, igrejas, pelourinho e o longínquo horizonte, sulcado por aprazíveis vales e ribeiras, bem como mais a norte a Serra da Malcata e para o sul Monsanto.
Após iniciamos uma breve incursão pedestre pelas ruas históricas até à Torre (onde se alcança uma vista esplêndida sobre a região), poço de el-rei, muralhas, o pelourinho junto duma porta de entrada para a antiga vila.
No final descemos de moto e percorremos algumas ruas da vila, evidenciando-se aquela calma reinante, com alguns a lançarem os seus olhares, pois ali somos estranhos. O estômago teima em dar horas, mas não há tempo a perder!
Atravessámos a vila e saímos no acesso norte para prosseguir pela EN233 em direcção ao Sabugal, tendo avistado as placas indicativas da Reserva Natural da Malcata (uma das serras mais bonitas de Portugal no estado verde mais puro), santuário do Lince Ibérico, mas não visitámos para não encurtar o tempo sobrante (ficará para outra altura, fica o reconhecimento deste belo local). Placas postadas á entrada afirmam ser Penamacor a capital do Lince.
Depois de passar por Meimoa e Vale da Sra. Da Póvoa, chega-se a um cruzamento onde à esquerda virámos para a N18-3, com destino a Sortelha.


3. SORTELHA: ALDEIA MUSEU DE PORTUGAL

Sortelha fica situada numa região de terrenos graníticos e relevos acidentados, distando 14 km do Sabugal, num território de passagem entre a denominada meseta ibérica e a depressão da Cova da Beira.
Sortelha é uma aldeia de granito tipicamente medieval, fechada por muralhas e vigiada por um castelo, situado no extremo sudeste da povoação, no ponto mais elevado, completamente assente sobre um pináculo rochoso e granítico.
Ali chegados os panorama é deslumbrante, é o fascínio do regresso ao passado. Iniciámos a visita pedestre pelas ruas da aldeia até ao castelo, muralhas e pelourinho. Do seu património destacam-se ainda diversas igrejas e capelas. A fome aperta e procuro saciar-me numas figueiras que cresceram entre rochas e paredes da aldeia. Ninguém me viu, mas se visse, tinha uma boa defesa: estado de necessidade desculpaste. Ou talvez não, pois o prato típico da região é a caldeirada de cabrito e o queijo. Outros sabores que se podiam descobrir eram os enchidos, a perdiz, o coelho à caçador, a sopa do lavrador, o doce de castanhas, o doce de abóbora, as papas de milho, e o pão de lho. Tudo ideias … mas não havia tempo nem eram horas para isso!
No final umas senhoras idosas, sentadas num banco de pedra, com as suas mãos calejadas e rugosas, encontravam-se aplicadas a fazer cestos de gracejo (gracejo é uma planta parecida com junco, que uma vez seca dela se fazem tranças para cestos, cozidos com uma agulha e linha), tendo proposto a compra, ao que lá anuímos...
O meu amigo ofereceu-me uma das sandes que levara à pressa e ofereceu-me uma (eram mais de 5 da tarde). Lá aceitei e quando me preparava para tão faustoso lanche, sentado naquele banco à entrada, logo fiquei rodeado de gatos, que miavam intensamente, famintos imploravam-me por um naco de pão. … Para não ter problemas de consciência (;-)) logo o parti e distribui pelos pobres bichos, ficando eu a miar com um “ rato no estômago”. Dito de outro modo, os gatos comeram o pão e eu o rato!
SORTELHA É UM DESTINO OBRIGATÓRIO PARA QUALQUER MOTOTURISTA.

4. SABUGAL

Prosseguimos viagem agora por uma estrada que dá directamente ao Sabugal, onde chegámos já com o sol quase a pôr-se no horizonte.
O Sabugal é cidade ( desde 2004) e sede de concelho, pertencente ao Distrito da Guarda, região Centro e subregião da Beira Interior Norte. Fica em Terras de RIBA- COA, assim como Pinhel, Almeida, Meda e Figueira de Castelo Rodrigo, zona de charneira entre a meseta ibérica e a Cova da Beira. Esta região tem touradas, diferentes das que se realizam pelo país fora, as célebres Capeias Arraianas.

Situa-se e em local sobranceiro ao Rio Côa tendo pertencido ao reino de Leão. Em 1175, pertencia ao concelho de Ciudad Rodrigo mas em 1190, D. Afonso IX de Leão funda o concelho do Sabugal e teria mandado edificar o castelo. No reinado de D. Dinis, passou a integrar definitivamente o território português, após a sua conquista ao reino de Leão e ter sido assegurada a sua pertença a Portugal, pelo tratado de Alcanices ( 1296).
O castelo é imponente e de grande beleza e bem conservado (parece é que, como aliás do de Penamacor, serviu no passado para as gentes retirarem pedra para as suas habitações ).
Segundo a tradição, terá sido junto a este castelo que se deu o milagre das rosas, quando a Rainha Santa Isabel, que distribuía esmolas, converteu as moedas em rosas, enganando o rei D. Dinis.
Arrancámos não sem dar uma breve ronda pelas ruas da cidade, para, com na noite a adivinhar-se, ainda passarmos por Alfaiates, já perto da fronteira.

5. ALFAIATES

Seguimos pela EN233-3 para Alfaiates. Esta aldeia situa-se em local planáltico, delimitado por terreiro e com construções.
Teve provável origem no séc. XIII com concessão de Carta de Foros e Costumes por Afonso X de Leão e então designado por Castillo de la Luna. Em 1297 passou a integrar o território português na sequência do Tratado de Alcañices.
Possui um castelo, rodeado por uma dupla cintura de muralhas, parcialmente ruídas e encerrado ao público, pelos vistos por haver risco da queda de pedras, conforme me relatou uma senhora de sotaque francês que assomou á porta. Após algumas fotos, mais uma ronda pelas ruelas de casas graníticas para abalar e dar por concluído o projecto.
Agora, enfrentávamos um dilema: regressar pelo mesmo caminho ou inovar seguindo até Vilar Formoso, ali já bem perto.

6. VILAR FORMOSO

Antevendo uma chegada mais rápida pela A25 ( ex-IP5) e por outra boa razão que ao adiante menciono, rumei até Vilar Formoso, pela N332, com o sol a pôr-se horizonte e pelo crepúsculo, percorrendo zona de planície, enquanto apreciava, como podia, a paisagem circundante, de perder de vista, vendo-se ao longe no horizonte, do lado espanhol, a cortá-lo, uma montanha, formando um quadro de invulgar beleza paisagística. Chegado a Vilar Formoso, tratei num ápice de passar a fronteira para atestar do lado de lá, ao preço de 1,01€/litro a gasolina 95 (enchi o depósito com 15€). Além disso, as bombas da cá pareceram-me encerradas umas, outras, com funcionários a ler o jornal …
E a fome? Quase que me esquecia que só tinha ingerido uns figos. Ah, e um rato. Voltas e mais voltas, entrei num restaurante apinhado de tujas, logo á saída da fronteira, do lado direito. O prato típico era as bifanas e “superlotes”, às dezenas. E foi assim que enganei a fome, tudo acamado por um café para despertar, quando tinha ainda 250Kms até casa.
Foi depois aquela viagem rápida, pela A24 (com um corte policial na zona das bombas da BP, para controle, ao que me pareceu, da entrada de estrangeiros, pois sendo fim de semana há muito movimento), parar para vestir umas roupas sobressalentes para enfrentar o frio já rigoroso e rumar até Viseu, para depois cortar pelo IP3 até Coimbra.
A viagem correu às mil maravilhas, embora o passeio fosse um pouco rápido e justificasse talvez aí uns dois dias para visitar tudo com calma, incluindo a Serra da Malcata que ficou por descobrir.
Eis como no espaço de 12 horas percorri uma zona do país, até então e para mim, desconhecida. Ninguém diga que as CBF'S não concorrem para a promoção cultural dos seus utilizadores …
Altamente recomendado!
Boas curvas e aquele abraço

®Virco